quarta-feira, 15 de julho de 2009

O desacerto da promiscuidade

(...)

A Constituição dos Estados Unidos proíbe que membros do Poder Legislativo exerçam funções executivas, e que membros do Poder Executivo sejam eleitos para o Parlamento, enquanto permanecerem em sua função (Article I, Section 6, n.2). Em suma: nenhum senador ou deputado pode pertencer ao Poder Executivo, seja como ministro ou servidor menor. Não pode o membro do Poder Legislativo subordinar-se a ninguém, a não ser ao povo. Aqui, no entanto, desde a Constituição de 1891, essa promiscuidade tem sido um dos maiores infortúnios republicanos. A República nasceu com apenas um poder de fato: os mesmos homens faziam as leis, cumpriam-nas ou não, conforme a conveniência, e eram os excelsos membros dos altos tribunais (como é exemplar o caso de Epitácio Pessoa).

É nessa origem espúria, a que o talento de Ruy Barbosa (e, lamentavelmente, com suas próprias razões) não ousou opor-se, que podemos encontrar os vírus da infecção generalizada do Congresso – e não só do Senado. Os parlamentares ditam as normas que irão cumprir, elaboram os orçamentos que seus amigos, companheiros e representantes dos mesmos financiadores, irão executar. No caso em que, marginalmente, o povo é favorecido, isso se dá apenas pelo interesse eleitoral imediato. Quando anunciam a reforma política, as propostas visam a assegurar o domínio das oligarquias partidárias, como a da instituição das listas fechadas, nunca buscam o aperfeiçoamento democrático.

Nenhuma reforma política terá qualquer efeito se essa promiscuidade não for interrompida – e já. A divisão dos poderes, desde Montesquieu, deve ser clara: quem legisla não pode executar. Em nossa história, como bem lembrou há dias Wilson Figueiredo, a infecção começou a agravar-se com o AI-5, quando os parlamentares, em lugar de entregar as chaves do Congresso ao porteiro, mantiveram as aparências do regime, em troca dos benefícios conhecidos. Nos últimos anos, com a liberdade de imprensa, os vícios dessa promiscuidade passaram a ser mais evidentes. Apesar disso, a tolerância da cidadania, reelegendo notórios corruptores e corruptos para os poderes legislativos da União e dos estados, impediu que a infecção fosse curada, no Estado e na sociedade.

O único remédio – se queremos salvar a República e evitar o pior – é convocar Assembléia Constituinte exclusiva, com a delegação popular única e imperativa, para redigir nova carta, prazo de trabalho definido e dissolução automática. Não há terceira via: estamos entre a razão moral e a anomia.


Texto de Mauro Santayana
Fonte: Jornal do Brasil, 15 de julho de 2009, pag A2

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Too Much Horror Business...

É muito fácil dizer "não me interesso por política", mas o contexto aqui, agora, não é explicitar erros ou desvios dos mandatários das nações, e sim refletir o caminho que estamos seguindo. Um caminho paradoxal de descobertas científicas e tecnológicas deslumbrantes, em detrimento ao humanismo e o que é realmente importante: PENSAR.

Texto FANTÁSTICO de Mauro Santayana publicado na página A2 do Jornal do Brasil de 9 de julho de 2009. Nos faz analisar que os tempos são negros, e todos estamos realmente perdidos, sem saber exatamente o que fazer ou que caminho seguir.


->Muito espetáculo, poucos resultados

Reúne-se, em Áquila, o grupo dos países mais ricos do mundo. Ao comentar o encontro, o New York Times, em seu editorial, faz o retrato lamentável desse grupo que se arroga o direito de liderar o planeta. Começa com o anfitrião, Berlusconi, enroscado em seus casos com garotas de programa. O jornal resume sua atuação: Showmanship: perhaps. Leadership: no. Em seguida mostra – com a natural exclusão de Obama – como se encontram os outros, atônitos diante da crise econômica ainda não domada, das ameaças da pandemia, cuja evolução ninguém pode prever, ou das denúncias de corrupção, como o governo Brown, herdeiro dos desacertos de Blair; Ângela Merkel, esforçando-se na tentativa de salvar a maior economia da Europa; Medvedev sob a sombra de Putin; Sarkozy, sem agenda internacional coerente; e Taro Aso, impopular no Japão. Nem a China se salva: Hu Jintao não participa do encontro, que deve durar até amanhã: está agindo com mão de ferro para conter o conflito étnico em Xinjiang.

O mundo não sabe para onde vai
. É necessário reinventar a sociedade política, mas para isso são exigidas ideias, e elas parecem ter-se evaporado da Terra. Alguns historiadores, radicais em sua análise, mostram que há séculos a capacidade de pensar do homem vem minguando, como se os seus neurônios secassem. Não que faltem descobertas maravilhosas, no campo da ciência exata. Soubemos encabrestar os elétrons, partir o núcleo atômico, construir esses aparelhos fantásticos que são os computadores e a eles transferir a capacidade de resolver problemas de alta complexidade. As ideias que nos fazem falta são as do humanismo. A tecnologia, ao inventar as máquinas, sempre mais sofisticadas, que substituem os trabalhadores, poderia libertar os homens para a sua plena realização criadora. Mas o sistema capitalista não admite a distribuição dos resultados dessa produção a todos os homens. Ele exclui da sociedade econômica os trabalhadores descartados.

Um dos historiadores que lamentam o esvaziamento da inteligência ética é o professor Jacques Barzun, com seu monumental estudo From dawn to decadence: 500 years of Western Cultural Life, 1500 to the present. O livro foi editado no último ano do milênio, em 2000. Barzun – que tem a idade de Niemeyer (nasceu em 1907) – continua, como o arquiteto, a produzir. Seu estudo, como indica o título, mostra que a razão humana, construída ao longo dos dois milênios anteriores, chegou ao auge no Renascimento e, a partir de então, começou a decair. A erosão da cultura ocidental (e não nos esqueçamos de que a política é a mais importante manifestação de cultura) foi registrada também por Oswald Spengler em seu livro clássico A decadência do Ocidente, publicado em 1918. Essa constatação de que a inteligência declina, poderá, se tivermos sorte, promover nova efervescência intelectual, mas isso não parece provável. Quando nos encontrávamos no início do Iluminismo e suas promessas de igualdade, que levariam à Revolução Francesa, Giambattista Vico, com sua Scienza nuova, previu que o conflito de classes, o esvaziamento intelectual, o culto ao dinheiro e a corrupção do Estado levariam ao embrutecimento do homem e seu retorno à barbárie.

Não sejamos pessimistas como Vico, embora o seu raciocínio seja poderoso. Devemos registrar, no entanto, que os chamados "líderes mundiais" se encontram atropelados por desafios que não sabem enfrentar. Em Áquila, os governantes dos países mais ricos tentarão conservar os dedos e os anéis na divisão dos bens do mundo. É significativo que se reúnam em cidade parcialmente destruída, há poucos meses, por um terremoto. É provável que tivessem em mente associar a reconstrução da cidade à necessária saída para a crise mundial. Mas essa crise não é meramente econômica. É uma crise ética, porque a exacerbação do capitalismo conduziu à destruição do humanismo. Isso ficou claro com o desmascaramento do neoliberalismo. Madoff, condenado a 150 anos de prisão, por estelionato, é o símbolo do mundo criado por Reagan, Thatcher, Bush, com entusiástica adesão, entre nós, de Fernando Collor e Fernando Henrique, entre outros.

Para reconduzir o homem à sua própria alma, é urgente colocar os centros de reflexão, como as universidades e as confissões religiosas, trabalhando na reabilitação do pensamento humanista, ao lado da ação política dos cidadãos, no mundo inteiro.
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quarta-feira, 8 de julho de 2009

Throwing Things

You're leaving a trail for me
I see you up in the tallest tree
(You're) throwing things down at me
I'm starting to climb, well I'm starting on my knees

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Oposição política? Onde? É sério?

(...)

Não pode haver República democrática sem oposição. Não temos oposição. Primeiro porque não há partidos políticos, mas, sim, grupos de interesses, que se articulam entre si, como se articulam com os "poderes de fato" exercidos pelos homens de negócios na defesa da "estabilidade", ou seja, da permanência da injustiça. Não há partidos políticos, salvo os pequenos, que dão testemunho ideológico no Congresso, porque não há idéias em que os grandes se sustentem. Identificam-se, vagamente, como conservadores e liberais, e dizem oscilar em torno do centro. A oposição é de faz de conta. Faltam ao Parlamento de hoje homens de idéias e de ação.



Texto: Mauro Santayana
Fonte: Jornal do Brasil, 02 de julho de 2009, Pag A2